sexta-feira, 30 de abril de 2010

Avesso

A: Diz pra mim que não sentes! Que não sentes essa paixão eminente, essa vontade da encostar a pele, de sentir a textura dos dedos no dedo do outro, esse impulso quase que vital de estar perto, de sentir o cheiro do outro no teu próprio corpo, de olhar e ser olhado, vontade de se descobrir no outro, de dar-se a chance de se achar nesse outro eu, de se entregar, de mergulhar, mesmo que afogue. Não é assim que as pessoas fazem? Se enganam e se perdem? Vai, diz que já pressentes a dor, a falta, a saudade, a angustia. Finge que se importa com o que viria depois, finge que eu cheguei e passei e só. É isso, estou jogando a culpa pra você, todo o peso de nossa história tão pesada e ainda nem sequer concretizada pra cima de você. Diz que tô louca, que preciso de psicanálise, acupuntura, meditação, descarrego, macumba. Ou só diz que não preciso de você, que não preciso da tua metade. Me lembra que até hoje dormi nessa cama de casal vazia e não surtei, não fiquei paranóica, não pulei da janela, não cortei os pulsos, não tive uma overdose. Não vai ser dessa vez, não é mesmo?
A: ....
A: ....
A: Tenho pensado em ti. Na verdade, tenho, ininterruptamente, pensado em ti.
B: ...

Aí o ônibus vai embora, mas seus olhos ficam... Até o último segundo.

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